Julieta
Letra
Julieta Não és mais um anjo De bondade Como outrora, sonhava O teu Romeu Julieta, tens a volúpia Da infidelidade E quem te paga As dívidas sou euJulieta, tu não ouves Meu grito de esperança Que afinal, de tão fraco Não alcança As alturas do teu Arranha-céu Tu decretaste a morte Aos madrigais E constróis um Castelo de ideais No formato elegante De um chapéuJulieta, nem falar Em Romeu tu hoje queres Borboleta sem asas Tu preferes Que te façam carícias De papel Nos teus anseios loucos Delirantes Em lugar de canções Queres brilhantes Em lugar de Romeu Um coronel!
História da Canção
A canção "Julieta", composta por Noel Rosa, emerge no Rio de Janeiro dos anos 1930, período de intensas transformações sociais e culturais. Noel, conhecido por sua aguda observação do cotidiano carioca e da alma humana, utiliza nesta letra uma de suas marcas registradas: a crítica sutil e irônica às mudanças de comportamento, especialmente no que tange às relações amorosas e à ascensão do materialismo.
Nesta obra, Noel pinta o retrato de uma Julieta que se desviou do ideal romântico e puro associado à figura shakespeariana. O "Romeu" que sonhava com uma Julieta "anjo de bondade" agora se vê diante de uma mulher "com a volúpia da infidelidade", cujas dívidas ele, Romeu, ainda paga. A letra é um lamento pelo amor idealizado que sucumbiu à realidade pragmática e materialista. A "borboleta sem asas" que prefere "carícias de papel" (dinheiro) e "brilhantes" em vez de "canções" é uma metáfora poderosa da inversão de valores.
A culminância da crítica está na troca do "Romeu" por um "coronel". O coronel, figura de poder e riqueza (frequentemente associada ao sertão e ao autoritarismo, mas aqui adaptada ao contexto urbano como um homem de posses), representa a segurança material em detrimento da paixão e do idealismo. Noel, com sua inteligência peculiar, não apenas narra uma história de desamor, mas tece um comentário social mordaz sobre a desvalorização dos sentimentos genuínos em face do status e da segurança financeira, um tema recorrente em sua obra.
A melodia, típica dos sambas de Noel, embala essa crítica com uma leveza que a torna ainda mais pungente. "Julieta" é um exemplo clássico da habilidade de Noel Rosa em capturar a complexidade da vida carioca, transformando observações do dia a dia em poesia atemporal.
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