Composição de 1933

E não brinca não

Letra

Pega na saca,
Tira a jaca,
Leva a faca,
Que a macaca
Sai da estaca
Ela te ataca
À traiçãoE não brinca não...
Que ela hoje tá com o cão!Seu Fortunato,
Olha o rato
No sapato.
E o seu gato,
Que é de fato,
Foi pro mato
Com meu cão.E não brinca não...
Que vais ficar de pé no chão!Com sua farda,
Toda parda,
Bem galharda,
Na vanguarda,
De espingarda,
Vem um guarda
No pifão.E não brinca não...
Que ele tá cheio da razão!Dona Adalgisa
Só me avisa,
Só me frisa
Que a camisa
Não é lisa
Não precisa
De botão.E não brinca não...
Que não tá paga a prestação!Eu bem dizia
Que eu sabia
Que a Maria
Fazia
Na sacristia
Cortesia
Ao sacristão.E não brinca não...
Que até o padre é gavião!

História da Canção

“E Não Brinca Não” é um samba que reflete a genialidade de Noel Rosa em sua capacidade de pintar um quadro vívido do cotidiano carioca da década de 1930. Lançada em 1933, a canção é um exemplo primoroso da “crônica cantada” que o Poeta da Vila dominava com maestria, transformando observações prosaicas em versos cheios de humor, ironia e um toque de malandragem.

A letra é construída como uma série de pequenas cenas ou avisos, cada uma concluída com a advertência repetida: “E não brinca não...” que adiciona um tom de ameaça lúdica e fatalista. Noel navega por diversos microcosmos da vida urbana:

  • A primeira estrofe, com sua sequência de ações e o perigo da “macaca” que “sai da estaca” e “te ataca à traição”, evoca um senso de imprevisibilidade e perigo quase selvagem, talvez uma metáfora para as armadilhas da vida.
  • Em seguida, somos apresentados ao “Seu Fortunato”, ironicamente confrontado com um rato no sapato e a ausência de seus animais domésticos, um toque de humor sobre o azar no dia a dia.
  • A figura do guarda, “com sua farda, toda parda, bem galharda”, que “vem no pifão” e “tá cheio da razão”, é uma observação clássica de Noel sobre a autoridade. Ele muitas vezes flertava com a crítica sutil às figuras de poder, humanizando-as ou expondo sua pretensão.
  • Dona Adalgisa e sua camisa que “não é lisa” e “não precisa de botão” trazem um detalhe doméstico, que se conecta à realidade financeira da época com a menção de que “não tá paga a prestação!”, um eco das dificuldades econômicas que muitos enfrentavam.
  • O ápice da malandragem e da crítica social vem na última estrofe, onde Noel revela a fofoca sobre “Maria” e sua “cortesia ao sacristão” na sacristia, concluindo com a frase irreverente: “Que até o padre é gavião!”. Essa passagem é um exemplo perfeito da forma como Noel desmistificava instituições e expunha as fraquezas humanas com uma inteligência mordaz, mas sem perder o charme do samba.

A música, portanto, é um mosaico de personagens e situações que capturam a essência da boemia e da vida popular do Rio de Janeiro. Noel Rosa, com sua poesia perspicaz, oferece um retrato atemporal da condição humana, embalado em um samba envolvente.

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