Dona Aracy
Letra
Dona Aracy! Dona Aracy! Quero saber Como anda isso por aí?Como vai o seu malhado? Seu marido em certidão Inda está desconfiado (Inda está desconfiado) Que é lesado pelo irmãoComo vai a sua filha? Que namora no porão Se a senhora não estrilha (Se a senhora não estrilha) Quero uma apresentaçãoComo vão as suas joias? Tão bonitas, eu não nego Não passavam de pinoias (Não passavam de pinoias) Davam dez tostões no pregoQue foi feito do Renato? Que malvado, que troféu Que pisava no meu sapato (Que pisava no meu sapato) E cuspia no meu chapéu
História da Canção
Lançada por volta de 1935, "Dona Aracy" é um dos exemplos mais vibrantes da genialidade de Noel Rosa em transformar o cotidiano carioca em poesia e música. A canção é um retrato saboroso e irônico da vida de vizinhança na Lapa ou em outros bairros boêmios do Rio de Janeiro da década de 1930, período em que Noel era o cronista musical da cidade.
A letra, aparentemente simples, é na verdade uma minuciosa observação de personagens e situações. Noel, com sua acuidade característica, assume a persona de um "observador fofoqueiro" que pergunta sobre Dona Aracy e tudo que a cerca: o "malhado" (possivelmente gado ou até mesmo uma referência pejorativa ao marido), o marido "desconfiado" de ser "lesado pelo irmão" – uma insinuação de traição ou desonestidade familiar. A filha que "namora no porão" traz o elemento da moralidade e dos segredos familiares, enquanto o eu-lírico, com bom-humor, pede uma "apresentação".
A parte sobre as "joias" é um toque de mestre, revelando a vaidade e a dura realidade financeira: "Não passavam de pinoias / Davam dez tostões no prego". "Pinoias" era uma gíria para bijuterias ou joias de baixo valor, e "prego" referia-se à casa de penhores, indicando a necessidade de se desfazer delas por pouca coisa. A menção a Renato, um "malvado" que "pisava no meu sapato / E cuspia no meu chapéu", completa o quadro de um cotidiano cheio de pequenos atritos e figuras marcantes.
A repetição de versos entre parênteses é uma marca registrada de Noel, que reforça a ideia de um "comentário à parte" ou de uma verdade sussurrada. "Dona Aracy" não foi necessariamente um grande sucesso comercial como "Com que Roupa?", mas seu valor histórico e artístico é imenso, pois encapsula a essência da sátira social e da crônica musical que tornaram Noel Rosa o "Poeta da Vila". É uma janela para a alma do Rio antigo, vista pelos olhos de seu mais perspicaz observador.
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