Composição de 1934

Cem mil réis

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Letra

Você me pediu cem mil réis,
Pra comprar um soirée,
E um tamborim,
O organdi anda barato pra cachorro,
E um gato lá no morro,
Não é tão caro assim.Não custa nada,
Preencher formalidade,
Tamborim pra batucada,
Soirée pra sociedade,
Sou bem sensato,
Seu pedido atendi,
Já tenho a pele do gato,
Falta o metro de organdi.Sei que você,
Num dia faz um tamborim,
Mas ninguém faz um soirée,
Com meio metro de cetim,
De soirée,
Você num baile se destaca,
Mas não quero mais você,
Porque não sei vestir casaca.

História da Canção

"Cem Mil Réis" é uma joia do cancioneiro de Noel Rosa, lançada em 1934, que mais uma vez demonstra a argúcia e o humor sutil do Poeta da Vila. A canção se desenrola como um diálogo irônico, onde Noel expõe a discrepância entre o pedido extravagante de uma moça e a realidade financeira e social da época.

A letra inicia com um pedido substancial – cem mil réis (uma soma considerável para a época) – para a compra de um soirée (vestido de festa luxuoso) e um tamborim. Noel, com sua sagacidade característica, imediatamente contrapõe a sofisticação do soirée com a simplicidade do tamborim, um instrumento essencial para a batucada popular. Ele ironiza a facilidade de encontrar materiais baratos, como o organdi "pra cachorro", e a facilidade de obter um "gato lá no morro", sugerindo que a moça está pedindo algo muito além de suas possibilidades ou da sua própria realidade.

A virada humorística acontece quando Noel afirma ter "preenchido a formalidade" do pedido. Ele brinca que já tem a "pele do gato", uma forma de indicar que arranjou algo barato, talvez uma imitação ou um substituto cômico para o luxo desejado, mas ainda falta o "metro de organdi" – o tecido nobre. Isso sublinha a disparidade entre o que é fácil e barato (o gato) e o que é realmente caro e aspiracional (o soirée).

O clímax da canção revela a incompatibilidade social e pessoal. Noel reconhece que um soirée é fundamental para se destacar em um baile, mas conclui a relação com um toque de elegância e resignação: "Mas não quero mais você, Porque não sei vestir casaca." Esta frase é carregada de simbolismo, indicando que ele não pertence ao mundo da formalidade e da ostentação que a moça almeja. É um adeus disfarçado de autoafirmação, onde ele prefere sua autenticidade boêmia à artificialidade de um mundo que ele não sabe (ou não quer) habitar. A canção é um espelho das tensões sociais do Rio de Janeiro dos anos 30, entre a boemia e a alta sociedade, o luxo e a simplicidade, sempre filtrado pelo olhar crítico e bem-humorado de Noel Rosa.

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