Dono do meu nariz
Letra
Miséria... de vez em quando Prestamistas recitando Minhas contas no portão E a criada, calmamente, Diz que eu estou ausente E não lhe deixei tostão...Mas alguém que está gozando Porque vive me manjando Percebeu que eu não saí... E aspiro no terreiro L'Origan de galinheiro Meu L'Origan de "galli"...¹E no meu ninho de penas Vejo aves tão serenas A quem dei milho na mão O vendeiro por afronta Suspendeu a minha conta E eu vou ficar sem feijão...Dono deste meu nariz, Não paguei porque não quis... Não sou de todo infeliz Por consolo vou gritando: Neste meu nariz eu mando... E... galinha não tem nariz! ¹ Jogo de palavras com certa colônia bem em voga à época: L'Origan de Coty[Paródia para Dona da Minha Vontade, de Francisco Alves e Orestes Barbosa]
História da Canção
'Dono do meu nariz' é uma das mais brilhantes e autoirônicas composições de Noel Rosa, representando de forma singular o espírito do 'Poeta da Vila' e o cotidiano da boemia carioca dos anos 30. Trata-se de uma paródia genial da canção 'Dona da Minha Vontade', um sucesso romântico de Francisco Alves e Orestes Barbosa, lançada em 1934.
Noel, com sua sagacidade inconfundível, subverteu a melodia e a estrutura da obra original para narrar sua própria realidade: as constantes pressões financeiras, os prestamistas na porta e a arte de se esquivar de cobranças. A letra descreve com humor a cena em que a empregada diz que ele está ausente e sem tostão, enquanto alguém que o 'manja' (observa) percebe que ele não saiu, aspirando no terreiro um 'L'Origan de galinheiro' — uma alusão hilária ao luxuoso perfume L'Origan de Coty, trocando a fragrância sofisticada pela rusticidade do quintal.
A canção é um retrato vívido da vida de Noel, que, apesar das dívidas e da miséria ('o vendeiro suspendeu a minha conta e eu vou ficar sem feijão'), jamais perdia a pose ou o bom humor. O refrão 'Dono deste meu nariz, não paguei porque não quis... Neste meu nariz eu mando...' é um grito de independência e autoafirmação, típico da personalidade de Noel, que se recusava a ser dominado pelas adversidades. A sacada final, 'E... galinha não tem nariz!', é um toque de nonsensicalidade e malandragem que arremata a canção com uma risada, reafirmando sua autonomia e desdém pelas convenções, mesmo diante da falta de recursos.
Esta música não só diverte como também oferece um panorama autêntico da luta e da resiliência dos artistas da época, que, com criatividade e ironia, transformavam suas dificuldades em arte.
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