Ando cismado

Noel Rosa, o “Poeta da Vila”, foi um observador aguçado e crítico do Rio de Janeiro dos anos 1930. Sua obra, que mesclava o humor, a crítica social e a poesia do cotidiano, revolucionou o samba. “Ando Cismado”, lançada em 1934 na voz de Mário Reis, um dos grandes intérpretes de Noel, é um belo exemplo da sua capacidade de explorar as nuances dos relacionamentos humanos.

A canção reflete a desconfiança e o ciúme, sentimentos recorrentes nas letras de Noel, mas aqui apresentados com uma resignação quase dolorosa. O eu-lírico expressa uma premonição de traição (“Que me enganei com você... Eu cismado espero agora / Ver você a qualquer hora / Dando ao outro o coração”), decidindo que, caso ela se concretize, a partida será silenciosa e definitiva (“Sem explicar por que razão”).

A melodia, típica dos sambas-canções da época, carrega a melancolia da situação, enquanto a letra, direta e sem rodeios, pinta um quadro de um amor em xeque. A música captura a essência da boemia carioca, onde paixões e desilusões se entrelaçavam no ritmo do samba. É uma obra que, embora talvez não tão popular quanto outros clássicos, demonstra a profundidade psicológica e a sensibilidade de Noel ao retratar as complexidades do coração humano.