Cordiais saudações
Letra
Estimo que este mal traçado samba Em estilo rude Na intimidade Vá te encontrar gozando saúde Na mais completa felicidade (Junto dos teus, confio em Deus)Em vão te procurei Notícias tuas não encontrei Eu hoje sinto saudades Daqueles dez mil réis que eu te emprestei Beijinhos no cachorrinho Muitos abraços no passarinho Um chute na empregada Porque já se acabou o meu carinhoA vida cá em casa Está horrível Ando empenhado Nas mãos de um judeu O meu coração vive amargurado Pois minha sogra ainda não morreu (Tomou veneno, e quem pagou fui eu)Sem mais, para acabar Um grande abraço queira aceitar De alguém que está com fome Atrás de algum convite pra jantar Espero que notes bem Estou agora sem um vintém Podendo, manda-me algum Rio, sete de setembro de trinta e um(Responde que eu pago o selo)
História da Canção
"Cordiais Saudações", escrita por Noel Rosa em 1931, é um exemplar brilhante da sua maestria em transformar a vida cotidiana e as agruras financeiras em poesia carregada de ironia e humor. Conhecida como uma "carta cantada", a canção começa com saudações formais, que rapidamente dão lugar a um lamento sincero – e hilário – sobre as dificuldades enfrentadas pelo eu-lírico.
A letra revela um Noel Rosa (ou um personagem que o representa) em situação financeira precária. Ele "está com fome", "sem um vintém", "empenhado nas mãos de um judeu" (expressão comum à época para agiotas), e não hesita em cobrar os "dez mil réis" emprestados. A menção de "sete de setembro de trinta e um" contextualiza a música no período pós-Crise de 1929, um tempo de instabilidade econômica que afetou muitos brasileiros, incluindo os boêmios e artistas do Rio de Janeiro.
A genialidade de Noel reside na forma como ele mescla a polidez ("Estimo que este mal traçado samba", "Um grande abraço queira aceitar") com a mais pura e divertida desesperança. As "saudades" dos dez mil réis, os "beijinhos no cachorrinho", "abraços no passarinho" contrastando com "um chute na empregada" e a impagável constatação de que "minha sogra ainda não morreu (Tomou veneno, e quem pagou fui eu)" demonstram um domínio ímpar da sátira. O toque final, "Responde que eu pago o selo", é a cereja do bolo da sua sagacidade e da sua situação caótica. A canção é um retrato vívido da boemia carioca e das suas lutas, sempre temperadas com um sorriso cínico.
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